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Capítulo 410

O Começo Depois do Fim

04/13/2024

O Começo Depois do Fim

Capítulo 410: A Melhor Escolha

Eleanor Leywin

Quando ouvi os anões animados murmurando mais alto, entrei mais nas sombras da sala onde me escondi. Os guardas adiante no corredor não haviam saído das suas posições em frente ao laboratório de Gideon, porém abriram a porta para tentar escutar o barulho abaixo, que funcionava a meu favor.

Com a minha Vontade Bestial ativa, pude ouvir Daymor Silvershale tendo a sua concessão. A sensibilidade aumentada não só captou o som de longe, mas também traduziu a vibração sutil dos movimentos deles e o uso de mana através do chão.

Daymor e outros três anões irromperam no corredor um momento depois, conversando como um bando de adolescentes no distrito comercial.

“Ah, mal posso esperar para ver o rosto do velho Earthborn quando ele souber do meu novo poder,” disse ele. “E dos meus irmãos mais velhos também, como eles têm dominado a participação nas reuniões do conselho sobre a minha cabeça. Bem, vamos ver quem tem algo para se gabar agora!”

Outra voz foi rápida em acrescentar: “um aumentador de elemento duplo, o primeiro em três gerações dos Silvershales. Seu pai ficará em êxtase, senhor.”

A conversa significava pouco para mim. Assim, apesar do fato de que eu poderia ter continuado a ouvi-los por pelo menos alguns minutos, mesmo enquanto se distanciavam cada vez mais, tentei me concentrar no meu irmão e naqueles com ele — Gideon, Emily Watsken e uma mulher que pensei que deveria ser a Retentora capturada, Lyra — que estavam mais uma vez fechados em uma câmara sob mim. Precisava me concentrar por meio de duas portas e três metros de pedra sólida além, entretanto, se prendesse a respiração, poderia distinguir as vibrações fracas do diálogo deles.

“Como está se sentindo?” Perguntou o meu irmão a Emily.

“Tudo bem, só preciso de um momento de descanso.”

“Dê a ela uma ou duas horas, pelo menos, antes de tentar o ritual de novo.” Disse a Retentora.

A resposta de Gideon foi mais alta do que as outras. “Mas eu preciso de uma terceira cobaia, ou o que vimos até agora é inútil! Alguém com quem Arthur passou muito tempo, a maior parte do tempo, horas e horas. Sem meio-termo ou próximo, tem que ser…”

“Gideon, pare de ativar o seu feitiço,” respondeu Arthur, o tom exasperado e resignado.

O velho artífice limpou a garganta e murmurou algo que não entendi, graças a alguma coisa pesada caindo no chão uns andares acima e uma voz profunda de um anão xingando.

Mudei de posição, mantendo um olho na porta aberta para esta sala e me inclinando para mais perto do chão, tentando ouvir melhor.

“Tenho que pensar, e a Emily tem que descansar, Gideon.”

“Tudo bem, tudo bem, mas não leve o dia todo. Faça a sua escolha e traga a pessoa aqui esta tarde.”

Eles se despediram, e ouvi as garras de Regis raspando na pedra quando começaram a vir na minha direção.

Dei uma rápida olhada ao redor da sala na qual me escondi, que ficava no final do corredor do laboratório. Parecia uma sala de aula abandonada, cheia de mesas do tamanho de anões, algumas manchadas de fuligem, e prateleiras vazias. E haviam removido a porta.

Eu devia estar bem perto da parte de cima da câmara de experimentos do Gideon.

Arthur e Regis andavam em silêncio, contudo, sabia que podiam se comunicar sem falar. Me perguntei sobre o que conversavam… Ou talvez em quem estavam pensando.

Necessitavam de alguém com quem o meu irmão passara muito tempo — uma pessoa muito próxima — para a próxima etapa da experiência…

De imediato quis que com certeza fosse eu. Não porque queria uma runa alacryana — ou um “feitiço pré-definido”, como Gideon e Arthur se referiam a elas — embora um súbito impulso ao meu poder e clareamento do meu núcleo soasse bem. O que desejava mesmo era estar envolvida e ser útil. Levando em conta a nossa longa jornada pelo deserto juntos, nosso treino e meditação, refeições e até sonos juntos, nem a mamãe havia passado mais tempo com ele.

Claro, sabia que ele não iria querer me colocar em risco.

Então, só preciso convencê-lo de que sou a única escolha, pensei, me preparando para a tarefa.

Vi Arthur e o grande lobo passarem por onde me escondi com cuidado atrás de uma mesa maior. Em vez de sair na hora, me concentrei nos passos deles, esperando até que estivessem muito à frente para me notarem. O corredor estava limpo, exceto pelos dois guardas, e se ficasse contra a parede mais distante, poderia usar as colunas de suporte encostadas nas paredes planas para ficar fora da sua linha de visão, que nem como fiz ao me esgueirar até aqui. Os guardas estavam animados e focados em si mesmos, afinal, conversando a respeito de Daymor e o que as experiências significariam para Vildorial.

Com a Vontade ainda ativa, eu ficava sensível até ao menor barulho, em especial o meu, o que me ajudou a rastejar em silêncio absoluto. Não achei que teria problemas só por estar nesses túneis, mas não queria que Arthur soubesse que eu o espionava após ele fugir com tanta pressa. Ficaria chateado comigo, diria que eu sempre desconsiderava a minha segurança e assumia riscos desnecessários, alheio à hipocrisia da própria fala.

Me forcei a parar de pensar naquilo para pensar em como iria convencê-lo a me deixar participar.

Ele estava caminhando devagar, sem dúvida pensando profundamente, e assumi que ele estava indo para casa. Tomando um caminho um pouco mais longo de volta, corri em silêncio, usando os meus sentidos aguçados para evitar cruzar caminhos com qualquer um dos guardas, magos ou outros residentes que frequentavam os túneis.

Ao invés de entrar, no entanto, me inclinei contra a parede ao lado da porta e esperei. Quando, minutos depois, ouvi o raspão de garras, desativei a Vontade Bestial e, com cuidado, pus um sorriso inocente no rosto.

Quando Arthur deu a volta na esquina, dei um pequeno aceno e falei: “Tudo bem lá embaixo?”

Ele parou, a sua surpresa estampada na cara com clareza. “Sim, não era uma emergência. O que você está fazendo aqui?”

“Esperando por você,” respondi, cravando os dedos da minha sandália no chão. “Você ficou fora por um tempo.”

“Gideon.” Falou a título de explicação, tirando de mim um sorriso maior.

Ele se inclinou contra a parede em frente a mim no corredor e me observou em silêncio. Senti a culpa arrepiar nas costas dos meus braços, pensando na melhor maneira de convencê-lo a me escolher sem entregar a minha escapada atrás dele.

“O que tem de errado?” Questionou depois de um momento.

“O quê? Nada.” Coloquei uma mecha atrás da orelha.

Os seus olhos se estreitaram, e então a expressão dele se suavizou. “Quanto você ouviu?”

Abri a boca, e ele ergueu uma sobrancelha. Em vez de tentar mentir, soltei um suspiro forte. “Como você sabia?”

“A sua culpa pode muito bem estar escrita na sua testa com tinta.” Riu.

Grunhi, puxando o cabelo na frente do meu rosto para esconder os olhos. “Desculpe, eu só…”

“Entendi. Está tudo bem.” Acenou em um gesto apaziguador.

Apesar do seu perdão, o silêncio que caiu entre nós foi amargo e estranho. “Quero ajudar com a tentativa de concessão.”

Ele assentiu, sério. Não houve sorrisos surpresos ou risos incrédulos, o que me fez sentir melhor. Ele aparentava estar, de fato, considerando a possibilidade.  “Já decidi que será a Jasmine. Ela é mais velha e mais testada em batalha, e passou quase tanto tempo comigo quanto você.”

Eu havia antecipado a resposta, porém permaneci em silêncio.

Regis, que andava de um lado para o outro no corredor, parou. “Além disso, fiquei no núcleo dela por uns dias. Pode fazer diferença também.”

“Quando eu estava no acampamento com os alacryanos, alguns deles eram muito jovens,” rebati, trazendo à tona o contra-argumento preparado por mim. “Eles têm as primeiras concessões muito cedo, certo? Sou muito mais jovem do que Jasmine, mais perto da idade em que uma concessão deveria acontecer.”

“Bom ponto, Ellie.” Falou, transitando o olhar entre mim e Arthur.

“Não se trata apenas de você ser a minha irmã,” se afastou da parede, dando um passo adiante. “A verdade é que você tem muitas variáveis que ela não tem. Você é uma maga de mana pura sem afinidade elementar, uma domadora de feras e tem ancestralidade djinn. Variáveis significam perigo neste caso, El.”

“Ainda assim, eu…”  Segui em frente, sem saber como responder. Não tinha um argumento fora a certeza de que, apesar dos riscos, eu era a melhor escolha.

“Por que você insiste tanto nisso?” Me inspecionou com cuidado com aqueles olhos dourados brilhantes. “Esta não é a única chance que você terá. Depois que o processo for testado e assegurado, você terá a sua vez, prometo.”

“Você não vai conseguir entender,” respondi, olhando para baixo. A tensão me invadiu, e o instinto de enterrar o que eu estava sentindo dificultou a fala. “Você não precisa se acovardar com a sua mãe toda vez que Retentores ou Foices batem à porta, dizendo a si mesmo que está a protegendo quando ambos sabem muito bem que você não está e que é inútil contra o inimigo…” Me afastei dele, olhando para o corredor vazio. “É só… Frustrante demais se sentir tão indefesa…”

Descansei a cabeça à parede e soltei um longo suspiro. Conseguia sentir o seu olhar queimando na lateral do meu rosto, entretanto, não queria olhar para ele; não queria ver pena, desaprovação ou decepção.

Houve um rangido de dobradiças de repente. “Você deve escolher Ellie.” Disse a minha mãe.

Com o queixo frouxo, surpresa com a intervenção, me virei para olhar para ela. Mesmo que eu convencesse Arthur, esperava ter a briga de novo com ela.

Ele aparentou ter sido pego com tanta surpresa quanto eu, e esfregou a nuca desajeitadamente. Não respondeu.

“Você ouviu tudo?” Perguntei.

“Vocês não estão sendo tão quietos aqui.” Ela me deu um sorriso irônico, nos observando por um momento, triste, porém determinada, antes de continuar.

“Estamos, todos nós, em constante perigo. Talvez correr riscos seja o único caminho a seguir. Talvez… Tenhamos sido muito cautelosos, muito dispostos a deixar você nos proteger. Mas não tem como saber quando um de nossos muitos inimigos aparecerá e fará chover o fogo do inferno sobre nós. Você pode não estar aqui na hora; se o inimigo for sábio, se certificará disso. Parece que isso pode ser uma maneira de nos ajudar a nos preparar, e se a sua irmã é a melhor escolha de teste, então que seja.”

Mordendo o lábio inferior, trêmula, fiquei sem palavras. Havia um certo cansaço nos olhos dela que quase partiu o meu coração.

“Tudo o que sempre quis, mesmo antes da guerra e de qualquer coisa começar, era poder para proteger vocês,” disse ele, a voz baixa e triste. O seu rosto estava escondido atrás do cabelo. “Acho que mesmo agora, depois de tudo o que aconteceu, não posso fazer isso.” Terminou, o queixo se inclinando para revelar um sorriso dolorido.

Ela atravessou o corredor, pondo a mão no cabelo dele. “Não podemos ter certeza do amanhã,” Se virou para olhar para mim. “Mas temos o hoje, e tem muito o que podemos fazer com ele.”


Emily estava nos esperando no laboratório, uma grande sala cheia de mesas, prateleiras, equipamentos bagunçados e pilhas de notas, tudo aquecido por uma grande fornalha de sal-de-fogo de um lado. Ela me deu um olhar interrogativo, que depois se foi para Arthur. Ele apenas assentiu, então ela deu de ombros, se virou e conduziu nós quatro por uma abertura arqueada na nossa frente, descendo um lance de escadas até uma porta específica.

Olhei ao redor do salão sem peculiaridades, tentando mapeá-lo em comparação com a sala de aula acima, curiosa sobre a força dos meus sentidos bestiais.

A porta se abriu ao toque de Emily, e ela nos levou a uma câmara plana e mal iluminada. Um círculo de runas fora esculpido no chão e preenchido com um metal prateado que brilhava um pouco, e algum tipo de artefato havia sido construído fora do círculo. Uma única mesa estava empurrada contra uma parede, e uma variedade aleatória de itens estava sobre ela.

O mestre artífice, Gideon, brincava com o equipamento, enquanto a Retentora, Lyra Dreide, estava sentada de costas para as paredes curvas e examinava um tomo antigo.

“Já era hora,” murmurou ele, dando a mim um olhar superficial. “A irmã, hein? Bem, suponho que há pessoas piores com quem você poderia ter passado todo o seu tempo. Ela não é uma candidata ideal, não é? Núcleo laranja escuro, uma domadora de feras — sem ideia de como isso interage com a concessão, se é que interage — e quase uma criança. Uma cobaia mais madura seria…”

“Eu sou uma Leywin. Meu irmão e eu tivemos que amadurecer rápido.” Claro, havia o pequeno detalhe do meu irmão já estar na fase adulta, mentalmente, quando nasceu, entretanto, não sabia quantas pessoas estavam cientes desse fato. “Estou pronta para isso.”

“Oh, oh, está, é?” Perguntou, deixando o seu trabalho e se inclinando para mim. “Pronta para ter potencialmente um feitiço poderoso escrito na sua carne por magias desconhecidas e hostis e que com certeza será diferente de qualquer magia que a sua pequena mente tenha concebido antes e pode muito bem matá-la se você não seguir à risca o que é dito?”

Fiquei prestes a responder. Tudo tinha sido bem argumentando lá em cima, mas agora, aqui no escuro, vendo Emily vestida com as suas estranhas vestes cerimoniais, os dedos traçando as linhas de um cajado preto, fiquei nervosa.

“Ela está,” respondeu Arthur, colocando a mão no meu ombro.

Um súbito orgulho fervente aliviou os meus nervos e desenrolou o nó que se formava na parte de trás da minha garganta.

Emily se aproximou, me dando um sorriso reconfortante, e deslizou o braço pelo meu. “Você vai ficar bem, tenho certeza. Arthur já te contou o que vai acontecer?”

Assenti antes dela me levar ao centro do círculo e pedir para que eu me sentasse de pernas cruzadas. Ela sorriu mais uma vez antes de se mover para a mesa, onde deslizou algum tipo de pulseira sobre o pulso, e depois pegou o cajado.

“Senhora Leywin, recue um pouco, por favor.” Ela pediu educadamente.

Mamãe parecia hesitante, e tive certeza de que ela estava começando a se arrepender. O meu irmão, por outro lado, se ajoelhou do lado de fora das runas, me encarando. “Exposição máxima de éter.”

Gideon tinha tirado um caderno e uma caneta das vestes, escrevendo com fúria. A Retentora estava em silêncio na parede em frente à minha mãe.

A sombra de Emily me cruzou enquanto ela se movia para ficar atrás de mim. Podia senti-la pairando lá, e o meu instinto de me mover ou virar ardia, causando arrepios.

“Ellie, espera-se que possa ser doloroso,” contou Emily, o tom azedo. “Uma marca é recebida com facilidade por um mago veterano, mas até uma crista atingiu o mestre Gideon como um golpe, tirando o fôlego dele. Se você receber uma forma de feitiço mais forte…”

“Então o efeito no meu corpo também será mais forte.”

“Sim… Pronta?”

Cerrei os dentes e me sentei direito. Não tinha medo da dor. “Sim.”

Atrás de mim, ouvi ela começar a se mover, o tecido das vestes pesadas e cajado se arrastando na rocha. Uma longa expiração…

A luz do quarto mudou. Surgiu um brilho sutil, provavelmente do cristal no topo do cajado.

Daí, todos os meus músculos se contraíram.

Me mexi, as costas travadas em um arco desconfortável, a boca aberta, um gemido a meio caminho dos meus lábios, os dedos arranhando as minhas coxas, os olhos arregalados, tão largos que queimaram e se encheram de lágrimas. Tudo de uma vez.

Era como uma marcação, feito ferro quente, incendiando todos os nervos de todo o meu corpo.

A paralisia sumiu, o gemido se transformou em um grito fraco, me amassei no chão frio, retraí um suspiro fraco, lutando contra os próprios pulmões, que se recusavam a trabalhar.

Mamãe disse algo, um pânico que entrou e saiu de foco, seguido pelo barítono comandante de Arthur.

As minhas pálpebras se fecharam e, no escuro, tudo era pior. Não, não pior, era além disso. Tentei abri-las, porém não pude. Queria pedir ajuda, e a língua não deixou. A pressão centrada nas minhas costas cresceu mais e mais.

Uma mão poderosa me segurou pelo ombro, me arrastando de volta para uma posição sentada. Fiquei apenas um pouco ciente disso, pois parecia os últimos restos de um sonho assim que acordei.

Mana caiu sobre mim, onda após onda, como nada que já senti antes.

Os meus olhos se abriram. Duas esferas douradas que nem pequenos sóis pairavam logo acima, se movendo com rapidez em pequenas explosões.

O meu núcleo tremeu. Pensei que estivesse doente.

Então algo aconteceu que não tenho palavras para descrever. Sabia que estava morrendo, porque mesmo quando a lâmina do asura me atravessou, ainda me sentia eu mesma, presente para a dor em meu corpo. Agora, com uma rapidez impressionante, a dor tinha sumido, e não sentia nada fora a sua ausência.

“Ela está entrando em choque,” uma voz melosa disse com firmeza, trocando os olhos dourados por fios de cabelo vermelhos-flamejantes. “Eleanor, se concentre na minha voz. Pense e entenda o significado das minhas palavras. O seu núcleo está sendo rapidamente esclarecido e o seu corpo está lutando para se ajustar. Acabará em breve, mas você deve permanecer aqui. A sua mente e os seus pensamentos guiam o processo. Fique aqui, com a minha voz.”

Senti o meu rosto se contorcendo em confusão com o meu cérebro lutando não com o significado das palavras, mas para dar sentido à estranheza da situação: uma Retentora alacryana, responsável pela morte de dezenas de milhares dos nossos, me guiando com sinceridade através de um processo que roubamos do povo dela…

Acho que foi isso que me tirou da espiral fria que eu seguia. Voltei a respirar com mais facilidade, ciente da pedra fria pressionando as minhas pernas e traseiro; do suor agarrado ao meu rosto; da profunda dor em meus músculos devido ao súbito aperto e liberação; das mãos segurando cada lado do meu rosto com firmeza, me forçando a olhar nos olhos da Retentora.

Um leve sorriso surgiu no rosto dela, e ela me soltou. Me inclinei para frente, pressionando as mãos no chão e respirando devagar. Outra mão esfregou com delicadeza entre as minhas escápulas.

“Eleanor, precisamos olhar.” Disse ela. Só pude assentir em resposta.

Senti a borda da minha camisa ser puxada para cima quando Lyra se mexeu ao meu redor. Então mamãe estava lá, com as mãos apoiadas em mim. Os seus olhos seguiram a Retentora no início, contudo, depois se voltaram aos meus. Eles estavam cheios de lágrimas prestes a cair, apesar do sorriso trêmulo no rosto.

“Então, é verdade,” falou Lyra, a voz baixa e cheia de admiração. “Uma regalia. Isso… Não deveria ser possível.”

Com a mão livre, esfreguei a parte inferior das costas, onde a forma de feitiço ainda formigava.

“Vejam só! Isso empurrou ela para o estágio amarelo-claro.” Contou Gideon.

Animada, prestei atenção dentro de mim. Era verdade!

Embora estivesse dolorida e fadigada, sabia o que vinha a seguir, e mal podia esperar para começar. “Eu… Quero testar.”

“Podemos espe—” disse mamãe, mas Gideon já estava se movendo.

Ele tirou todos os outros de perto e ativou o artefato, formando uma bolha transparente de mana no círculo.

“Gideon.” Falou Arthur como um alerta. Também ignorado.

De pé diante mim, do outro lado, com um caderno na mão e os olhos brilhando de curiosidade, o artífice disse: “bem, vá em frente!”

A Retentora começou a me treinar durante o processo, explicando como procurar a runa. Com cautela, segui as instruções.

A runa floresceu em calor e poder enquanto mana canalizava para dentro dela a partir do meu núcleo. Esperei por alguma revelação, algum poder para se manifestar.

Não era que nada acontecesse; havia um certo foco na mana, como se eu estivesse mais ciente dos núcleos de todos e da barreira de mana manifestada no escudo, mas era isso.

“Talvez você não seja capaz de canalizar mana suficiente para ativar adequadamente as regalias.” Explicou a alacryana ao me ouvir dizer o que senti.

“Aqui, tente isso,” Gideon desativou o escudo e me entregou um grande cristal de mana, depois reativou. “Use.”

Olhei para Arthur, que estava observando tudo com cuidado, depois para mamãe, que tinha as duas mãos na boca, quase vibrando de nervosismo.

Fechando os olhos, puxei a mana presa dentro do cristal e a direcionei para a runa. A sensação de consciência dos arredores voltou, mas nenhum efeito adicional foi revelado. Liberei o meu controle do cristal com um suspiro.

“O que eu estou fazendo de erra—”

Emily, que estava encostada à mesa, deu um gemido suave e desabou. Arthur se moveu tão rápido que mal vi, a deitando antes que a cabeça dela batesse na pedra.

Um segundo depois, mamãe já estava pressionando as mãos na pele pálida de Emily, emitindo um brilho prateado. Ao tentar usar um feitiço de cura, trocou olhares com Arthur: “ela está em um efeito-rebote. Não posso curá-la, mas ela deve ficar bem com o tempo.”

Gideon mudou o peso de um pé para o outro e mordeu o lábio para ficar quieto. Aparentemente sem pensar, ligou o interruptor, desligando o escudo que me continha dentro das runas.

Fui para o lado da aprendiz dele, me ajoelhando ao lado do meu irmão e pegando a mão dela. Os seus olhos se abriram, entretanto, ela gemeu de dor e os fechou de novo.

Havia algo… Desconfortável em estar perto daqui. A consciência aprimorada de mana que senti ao ativar a regalia permanecia, e a ausência de mana no seu núcleo se destacava como algo errado ou antinatural e que precisava ser corrigido.

Mana fluiu para fora de mim em círculos brancos, brilhando na minha pele feito uma aura, e manobrou para dentro das veias de mana dela até o seu núcleo.

“Oh!” Ofegou perturbada, abrindo os olhos e suavizando a respiração. “B-Bom dia?”

A luz da troca de mana desapareceu.

Gideon estava rabiscando furiosamente no caderno com a caneta dele, contudo, todos ficaram quietos, arregalaram os olhos e se viraram para me encarar.

O que eu tinha acabado de fazer não deveria ser possível.

Capítulo 410

O Começo Depois do Fim

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